Cresci num contexto no qual sempre me senti um estranho, só pra você ter uma ideia, sou de família evangélica e pai militar. E gay. Não que isso devesse lá ser muito importante ou fosse motivo pra qualquer exclusão. Mas foi. E pelo jeito é.
Por diversas vezes ser eu mesmo era motivo de reprimendas, de coisas simples como um "senta direito menino!" ou "menino brinca com menino" e o clássico "boneca é para meninas!". E a gente vai sendo moldado pela vida, aprende que deve observar se tá gesticulando demais ou falando fino demais.
E chega um ponto que deixa a própria sensibilidade de lado. Aquele olhar que beirava a pureza vai dando espaço para o medo. Aquela expectativa ruim de não saber de qual direção viria o próximo olhar torto, a próxima agressão, física ou psicológica.
E a gente acredita que quando se torna adulto, de tanto levar porrada da vida, aprendemos a lidar. Que nos tornamos praticamente invulneráveis, que depois de certo tempo a gente consegue lidar. E até consegue.
Mas tem dias que a criança ferida lá no fundo da alma emerge e tudo fica mais dolorido. E a gente percebe que ninguém além da gente mesmo vai conseguir abraçá-la, secar suas lágrimas e mostrar que tudo vai ficar bem.
É difícil viver num mundo assim. Mas seguimos tentando. Mesmo que algumas situações nos mostrem o quanto a gente queria apenas fazer parte, nem que por um mero instante. Sentir que sua família e seu pai poderia mudar, ter mais empatia e acolher você em seus braços, fazendo você se sentir amado de verdade, filho de verdade.
Não apenas um estranho, quase que aquele sobrinho que mora fora e só é visto em raras ocasiões.
Será que um dia eu vou sentir que tenho um pai?
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